O Transtorno de Personalidade Borderline é um tipo de personalidade que se situa entre a neurose e a psicose, daí o termo “borderline” (que, em inglês, significa limítrofe). A depressão é um sintoma comum, afetando 80% dos indivíduos com essa personalidade. Esses casos de depressão tendem a ser mais resistentes ao tratamento, mais graves e com maior impacto no funcionamento social. Além disso, os sintomas geralmente retornam rapidamente após o tratamento.
É importante esclarecer que o transtorno de personalidade não é uma doença e, portanto, não tem cura a partir de um tratamento específico. O Transtorno de Personalidade Borderline é marcado por mudanças rápidas de humor, medo de abandono, relacionamentos instáveis e comportamentos impulsivos.
Ainda não se sabe a causa exata, mas acredita-se que uma predisposição genética possa desempenhar um papel importante. Além disso, é mais comum em indivíduos que sofreram maus-tratos na infância ou cujos pais abusaram de álcool ou drogas.
O diagnóstico do Transtorno de Personalidade Borderline deve ser feito por um psiquiatra, levando em consideração os sintomas, o comportamento do indivíduo e o impacto dos sintomas em sua vida pessoal e profissional.
Os principais sintomas incluem:
🔹Mudanças rápidas de humor – indivíduos com borderline experimentam flutuações intensas de emoções, variando entre raiva, tristeza e ansiedade em questão de horas ou dias.
🔹Identidade instável – dificuldade em manter uma identidade consistente, frequentemente alterando valores, metas e opiniões sobre si mesmos e os outros.
🔹Medo de abandono – existe um medo intenso de serem abandonados por amigos, parceiros ou familiares.
🔹Relacionamentos instáveis – os relacionamentos são marcados por idealização e desvalorização rápidas da outra pessoa.
🔹Impulsividade – isso pode se manifestar em comportamentos como gastos excessivos, abuso de substâncias, jogos de azar e decisões impulsivas.
🔹Comportamentos suicidas – em momentos de crise, a pessoa pode apresentar comportamentos, gestos ou ameaças suicidas.
🔹Raiva intensa e difícil de controlar – a raiva é frequentemente direcionada às pessoas próximas e seguida por sentimentos de vergonha e culpa.
🔹Sensação de vazio interior – uma persistente sensação de solidão e vazio.
Então, como a cetamina pode ajudar no tratamento de pessoas diagnosticadas com Transtorno de Personalidade Borderline?
Sabemos que a psicoterapia é fundamental para a continuidade do tratamento, para um melhor entendimento dos gatilhos e para uma melhor convivência com situações desafiadoras. No entanto, em momentos de crise, o psiquiatra pode indicar o uso de antidepressivos e antipsicóticos.
Recentemente, um estudo utilizou uma única infusão de cetamina para tratar a depressão em pessoas com borderline. Embora não tenham encontrado melhora na depressão, observaram uma melhora no funcionamento social. E não notaram efeitos adversos diferentes nessa população.
Neste estudo, foram feitas infusões endovenosas repetidas em pessoas com borderline e depressão. Foram selecionadas 100 pessoas, mas foi feita uma revisão de prontuário e o tratamento já havia sido feito. O estudo foi realizado na clínica do professor McIntire, da psiquiatria da Universidade de Toronto, no Canadá, que tem várias clínicas de cetamina espalhadas pelo país. Dois grupos de 50 pessoas foram comparados, metade com diagnóstico de borderline.
Os resultados foram interessantes.
Foi utilizada a escala BSL 23, que mede o estresse intrapsíquico de pacientes com borderline, como impulsividade, instabilidade emocional e outros sintomas típicos do transtorno de personalidade. Após a série de infusões, houve uma redução de 44% na escala, em 57% dos pacientes.
Isso sugere que o tratamento reduziu e até eliminou o sofrimento de pessoas com um transtorno de personalidade que, teoricamente, não deveria ser tratado com medicação. Afinal, é um comportamento e não uma doença. No entanto, a cetamina ajudou uma grande parcela dessas pessoas com apenas 4 sessões.
Pudemos identificar que é possível tratar o borderline e que a definição de “intratável por medicação” precisa ser revista.
Entre os grupos, ambos responderam igualmente nas escalas de depressão, ideação suicida e ansiedade. Ter borderline não prejudicou a resposta das pessoas.
Na escala de deficiência causada pela depressão, ambos os grupos mostraram recuperação em atividades sociais, familiares e laborais e produtividade.
Essa informação é muito importante!
As pessoas podem retomar a vida social, familiar e produtiva! Com ou sem Transtorno de Personalidade Borderline, além de não terem mais efeitos colaterais e responderem igualmente a quem não é borderline.
Diferentemente da medicação oral, com a cetamina, o borderline NÃO afeta a resposta. Várias meta-análises mostraram que não há medicação que possa modificar os sintomas de sofrimento do borderline, e foi mostrado aqui que a cetamina consegue.
A resposta que a cetamina mostrou foi igual ou superior à terapia dialética comportamental, a intervenção que melhor consegue ajudar quem sofre, após 6 meses de terapia.
Reforçamos que a indicação e aplicação da cetamina devem sempre ser feitas por um médico anestesista e dentro de um ambiente hospitalar.
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Referências:
Yatham, Lakshmi N et al. “Canadian Network for Mood and Anxiety Treatments (CANMAT) and International Society for Bipolar Disorders (ISBD) 2018 guidelines for the management of patients with bipolar disorder.” Bipolar disorders vol. 20,2 (2018): 97-170. doi:10.1111/bdi.12609
Swainson, Jennifer et al. “The Canadian Network for Mood and Anxiety Treatments (CANMAT) Task Force Recommendations for the Use of Racemic Ketamine in Adults with Major Depressive Disorder: Recommandations Du Groupe De Travail Du Réseau Canadien Pour Les Traitements De L’humeur Et De L’anxiété (Canmat) Concernant L’utilisation De La Kétamine Racémique Chez Les Adultes Souffrant De Trouble Dépressif Majeur.” Canadian journal of psychiatry. Revue canadienne de psychiatrie vol. 66,2 (2021): 113-125. doi:10.1177/0706743720970860
Kennedy, Sidney H et al. “Canadian Network for Mood and Anxiety Treatments (CANMAT) 2016 Clinical Guidelines for the Management of Adults with Major Depressive Disorder: Section 3. Pharmacological Treatments.” Canadian journal of psychiatry. Revue canadienne de psychiatrie vol. 61,9 (2016): 540-60. doi:10.1177/070674371665941
Morgan TA, Zimmerman M: Epidemiology of personality disorders. In Handbook of Personality Disorders: Theory, Research, and Treatment. 2nd ed, edited by WJ Livesley, R Larstone, New York, NY: The Guilford Press, 2018, pp. 173-196.
