Originalmente, a cetamina foi desenvolvida para induzir e manter a anestesia em cirurgias de curta duração e procedimentos que exigem sedação. Ela é especialmente útil em situações clínicas em que é necessário manter as funções vitais, pois, diferentemente de outros agentes anestésicos, possui um perfil que preserva a respiração.
Nos anos 1990, começou a ser estudada por John Krystal e sua equipe, para investigar o efeito de doses baixas da cetamina injetável sobre o humor das pessoas. Inicialmente, o foco de Krystal era entender mais sobre a depressão resistente e o papel do neurotransmissor glutamato na depressão.
No entanto, após alguns testes, Krystal percebeu o papel do glutamato também na depressão resistente. Isso inaugurou uma nova linha de pesquisas completamente diferente, pois até então, a hipótese mais aceita para a causa da depressão era a de que o transtorno era causado pela falta de serotonina ou desequilíbrio químico. Essa descoberta foi um marco importante, pois até então, acreditava-se que a depressão era causada principalmente por um desequilíbrio de serotonina no cérebro.
Em 2000, publicou a primeira evidência de que o composto produzia um efeito antidepressivo rápido em humanos. Em um estudo com apenas oito pessoas, metade apresentou redução superior a 50% nos sintomas depressivos em um dia após uma única aplicação. A cetamina deve ser administrada em doses mais baixas do que as usadas na anestesia para ter efeitos antidepressivos.
As principais indicações são:
Depressão resistente
Esse é um dos usos mais promissores. Pacientes que não respondem aos antidepressivos tradicionais podem encontrar na cetamina uma ação rápida e diferente, trazendo uma melhora significativa em poucas horas. Essa agilidade é um alívio em momentos de crise.
Dor crônica
Além da anestesia e dos tratamentos psiquiátricos, a cetamina também tem mostrado potencial no controle de dores crônicas e neuropáticas. Em alguns casos, ela tem sido usada para reduzir a dor em pacientes que não encontraram alívio com outros tratamentos.
Ideação suicida
Pensamentos ou planos de autoagressão são um sinal sério e podem aparecer em vários transtornos mentais. Estudos mostram que a cetamina pode reduzir rapidamente esses pensamentos, com resultados bem melhores que o placebo, especialmente em quem tem transtorno bipolar. Essa ação rápida ajuda a diminuir o risco de suicídio e melhora as funções cerebrais ligadas à regulação emocional. É fundamental lembrar que, embora os efeitos colaterais sejam leves, o tratamento com cetamina precisa ser feito em ambiente hospitalar e com acompanhamento médico.
Fase depressiva do Transtorno Bipolar
Na fase de depressão do transtorno bipolar, a cetamina proporciona uma melhora rápida dos sintomas sem o risco de desencadear episódios de mania ou hipomania. Ao contrário dos antidepressivos convencionais, ela atua bloqueando receptores específicos e aumentando o glutamato, o que favorece a formação de novas conexões cerebrais. Essa abordagem segura a torna uma opção promissora e confiável.
Como a cetamina age no cérebro?
O mecanismo de ação da cetamina difere substancialmente dos antidepressivos tradicionais. Enquanto a maioria dos medicamentos convencionais atuam modulando os níveis de serotonina, noradrenalina ou dopamina, a cetamina opera por meio de um bloqueio seletivo dos receptores NMDA (N-metil-D-aspartato). Este bloqueio promove uma série de eventos neuroquímicos importantes:
🔹 Aumento na liberação de glutamato: ao inibir os receptores NMDA, a cetamina causa um aumento na liberação do neurotransmissor glutamato, que é fundamental para a transmissão rápida dos sinais no cérebro.
🔹 Estimulação da neuroplasticidade: a elevação nos níveis do fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF) e a promoção de novas conexões sinápticas são essenciais para a restauração e fortalecimento dos circuitos neurais. Essa renovação das conexões cerebrais é a chave para a melhora rápida dos sintomas depressivos e para a reorganização da rede neuronal comprometida por traumas e estresse crônico. Essa abordagem diferenciada, ao fomentar a reestruturação e o fortalecimento das conexões entre os neurônios, explica o potencial da cetamina para proporcionar alívio rápido e duradouro em condições psiquiátricas que, tradicionalmente, requerem semanas ou meses para apresentar resultados com outras terapias.
A evolução do uso da cetamina reflete o constante avanço na compreensão dos mecanismos cerebrais e na busca por tratamentos mais eficazes e rápidos. Seja na anestesia, no tratamento da depressão resistente e outras doenças psiquiátricas, ou no manejo da dor crônica, a cetamina se destaca por sua capacidade de promover uma rápida e significativa mudança no funcionamento cerebral. Ao compreender as principais indicações e o diferencial do seu modo de ação – que vai além da simples modulação dos neurotransmissores convencionais – pacientes e profissionais podem se beneficiar de uma abordagem terapêutica personalizada e inovadora.
Se tiver interesse em saber mais sobre como essa abordagem pode ser aplicada ao seu caso específico, agende uma consulta e descubra todas as possibilidades que a cetamina pode oferecer para transformar seu tratamento e melhorar sua qualidade de vida.
Referências:
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Swainson, Jennifer et al. “The Canadian Network for Mood and Anxiety Treatments (CANMAT) Task Force Recommendations for the Use of Racemic Ketamine in Adults with Major Depressive Disorder: Recommandations Du Groupe De Travail Du Réseau Canadien Pour Les Traitements De L’humeur Et De L’anxiété (Canmat) Concernant L’utilisation De La Kétamine Racémique Chez Les Adultes Souffrant De Trouble Dépressif Majeur.” Canadian journal of psychiatry. Revue canadienne de psychiatrie vol. 66,2 (2021): 113-125. doi:10.1177/0706743720970860
